terça-feira, 19 de maio de 2015

::: Para os Corações Partidos

Entristeceu-me saber que um vídeo muito bom sobre términos de relacionamento desapareceu do Youtube porque o cidadão que o fez, dono do canal, sumiu da net.
Há uma lua nova sombria sobre os relacionamentos de várias pessoas próximas a mim, e é estranho que eu esteja bem dos assuntos do coração quando essas pessoas estão mal. Uma invertida dos fios, porque normalmente o contrário era o comum.



Assim sendo, dedicarei tempo e palavras e expressão a colaborar como posso com aqueles momentos da vida em que a maioria das pessoas que dá a cara à tapa em relacionamentos onde há doação se encontra: A fossa escura do término, as dores no pé de quem chuta, as tristezas inconsoladas de quem levou o fora, a imprevisão do tempo de sofrimento. Aos pós-modernos: Tenho vivência. Sobrevivi a mais de um "o problema não é com você, é comigo."

Eis, então, aqui, um dia antes de Wotan's Day, o que pode ser uma primeira parte de "Para os Corações Partidos", em retorno grato, sobretudo, à ajuda prestada por várias pessoas ao longo da minha ainda curta vida quando fui eu que precisei de aconselhamento amoroso-transpessoal-curativo-quironiano-serenatadeamor.

::: Para os Corações Partidos: Como continuar caindo



Desde criança, se passa na cabeça um relacionamentozinho, é para ser uma coisa legal e duradoura por um momento de brincadeira. Você, na brincadeira, é o mais power dos Cavaleiros do Zodíaco e fantasia uma vida a dois com uma das Chiquititas, mas não tem muita noção do que significa isso na vida adulta. Eu, pelo menos, não conheço casos de crianças que ficam imaginando como é dar o fora ou receber o fora.

Mas o fora está aí para ficar e, nesse mundo em que ninguém é de ninguém, uma das maiores provas de que o ser humano é biológico é sua necessidade de cheirar o cangote alheio. A gente se entrega. E se dá mal por causa disso, de maneiras diferentes, muitas vezes, dentro e ao fim de relacionamentos. E vai ser sempre assim. Escravos e imperadores já sofreram por amor. Corsários e detetives (noir), machões e decoradores de espaço pet, verdugos e hortelões, a história está cheia de casos desconhecidos e para sempre ignorados de amores que deram mal. É humano quebrar a cara por causa disso.

Eu sou um apaixonado sem jeito, e espero fazer minha parte para preparar os outros para lidar com essas coisas também. Sempre falo aos alunos do sentido da palavra "amante": aquele que ama. Na tradição pela qual lutam os conservadores (do tipo bate-forte-a-panela que eu quero é tic-tic-tá), você casava por motivos de status, society, posses... E aí o homem tinha a amante, aquele a quem ele amava, que coincidentemente não era aquela a quem seus pais tinham prometido ou firmado contrato a respeito de matrimônio.
O fora vem, para o amor, tão certo quanto a morte vem para a vida. E se não é o fora definitivo, que pra vida seria um golpe de morte, é uma série de foras tênues que vão matando a relação, que pra vida seria como o maço de cigarros que você fuma todo dia pra enegrecer o pulmão direito.

Quem dá o fora tem sua parcela de dor e dúvida envolvida. Aprendi isso pensando em quem me deu o fora mais do que nas vezes em que quem deu o fora fui eu. Mas é claro que nada da dor de quem chuta se compara com a dor de quem é chutado.
E, para o chutado, sua dor vira uma obsessão.
Imagine um consultório médico lotado. Há um cara que levou um tiro no peito, um que levou um choque de muitocentos mil volts na veia, outro que foi atropelado por um caminhão da Elma Chips e chega você, que pisou em um prego. Dói pisar num prego, todo mundo sabe. Mas aquela dor só você está sentindo. Tão entranhada, tão ardida, está no seu corpo, marcando você por dentro. E o que você faz? Entra em desespero porque o médico está preenchendo uma ficha para o cara que levou o tiro. Você começa a ficar sem ar, a achar que vai morrer negligenciado, ou que foi estúpido e não conseguiu mostrar ao médico o quanto você precisa de socorro e alívio.
Na vida, você, que levou o fora, é esse cara que pisou no prego e está momentaneamente privado de entender a gravidade das suas dores. E está certo nisso. Até porque, na vida, o médico não existe nessa situação. Você vai ter que encarar a pisada no prego como acupuntura artesanal.

Nas horas depois do fora, que parecem não ter fim, um dos piores conselhos que alguém pode dar é "Pare de sofrer, tem tanta gente sofrendo coisas mais graves por aí". Na verdade, esse conselho é tão horrível que não serve em situação nenhuma. Cada dor é única e individual, parte de um ser humano único  nas experiências e singular em sua identidade. Talvez você que levou o fora sinta mais a dor de ter levado esse fora do que muita gente que sofre mundo a fora sente essa sofrência pessoal. Até porque saber que tem gente que sofre coisas piores do que você não deveria servir para animá-lo.

O fato é que todo e qualquer conselho nessa hora vai cair em orelhas quase surdas. O sofredor do fora só conseguirá escutar e reter aquelas poucas opiniões que o incentivarão a lutar por um amor perdido, ou que lhe darão esperança, ou que irão de encontro a suas ilusões ou esperanças. Todo o resto, por mais que sejam pérolas da razão e compreensão, não servem. Não servem porque são fruto da ótica de quem vê a situação de fora. Pra quem está sentindo o fora entrando pela pele essa visão está além do possível por um bom tempo.



Mas antes de falar dessa dor especial, escravizadora e viciante, termino falando algo que pode até animar, mas que espero que no fundo não faça muita diferença: Bem ou mal, até essa dor passa. Meses ou anos mais tarde você vê que não consegue mais sentir aquela velha dor e, mesmo que não diga para si mesmo, vai vislumbrar lá no fundo da mente algo do tipo "acho que perdi tempo demais naquela época sofrendo por aquele pescocinho" ou "como pude achar que não ia mais dar certo?" ou até "quem diria que eu ia parar aqui".

E por mais que para você, meu caro sofredor(a) do fora, eu dizer que o tempo, de fato, faz pequena essa sua dor que agora é tão grande não seja um conselho hábil, fique tranquilo. Naquela paz que é possível se encontrar quando está tudo tão ruim que parece que a vida inteira saiu dos eixos. Sofra enquanto der, porque a vida continua e não haverá, um dia, tanto tempo para essa dor quanto há agora.

Em tempo, há um teste embutido no segundo parágrafo acima desse trecho aqui. Um "ilusômetro", ou "esperançômetro". Quando eu disse que na sua mente pode passar "como pude achar que não ia mais dar certo?", analise:
1 - se você pensou que não ia dar certo com outras pessoas, parabéns, você já deu um passo decisivo para longe de quem não te quis mais: viu-se ao lado de companhia mais agradável.
2 - se você pensou que eu estava me referindo a dar certo com a pessoa com quem um dia deu errado... Talvez você precise trabalhar um pouco mais a sua "criatividade emocional". Falarei disso depois.


Até que eu volte a falar disso, fique bem o quanto puder na hora que der. E cuidando com as quedas, sobretudo de coisas frágeis e de material cristalino.
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